quinta-feira, 27 de maio de 2010

Não temos tempo de temer a morte



Entrar no elevador ou receber uma circular condominial no meu prédio são sempre momentos emocionantes, pois não sabemos o que vamos deparar. Entre a proposta de transformar o salão de festas em uma casa de chá - como dizia Cazuza, são caboclos querendo ser ingleses - até a de construir uma rampa para cadeirantes, tudo é possível.
A última proposição foi a de construir uma brinquedoteca comum - com jogos e brinquedos que os infantes têm em casa -, como se as crianças não estivessem preocupadas em correr e liberar energia ao saírem do sufocamento de seus quartos. O argumento é sempre o mesmo: o perigo do mundo, evitar sair de casa por causa da violência... E, assim, os filhos de apartamento, com mentalidade tal, vão se propagando.
Não sei como se pode ambicionar criar uma pessoa esclarecida e ativa socialmente, se ela não conhece a vizinhança - pelo menos, não mantém nenhum contato sem o vidro do carro interpondo-se -. Vai ver que a idéia é só disseminar o "homem de bem", figura da qual tenho um medo profundo, cultivando o seu individualismo característico, capaz de tudo para manter sua proteção - e a da família, claro -.
Eu já vejo a questão por outro lado. Não é porque os perigos são inumeráveis que a solução é trancafiar-se. Pelo contrário, grandes combates são sempre necessários, e não se entra em ação lutando contra as quatro paredes do quarto, nem defendendo apenas SEU quinhão, deixando o do outro para ele se virar sozinho para cuidar.

"Nas ocasiões em que tudo leva ao medo, não se deve ter medo de nada; quando se está rodeado de perigos, não se deve temer perigo algum."
(Sun Tsé)

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Por um pouco mais de utopia



Não é preciso muita coisa para me fazer ter saudades do que não vivi nos anos 60/70. Mas o documentário Utopia e Barbárie reacendeu a esperança no porvir, por causa dos elementos que traz.
O filme, que começa com sobreviventes da bomba atômica contando uma das maiores barbaridades já cometidas pelo homem, chega até os dias atuais sem, ao contrário do que vemos com frequência, execrar a juventude do Século XXI, como se fôssemos homogêneos e alienados. Embora eu tenha muitas críticas a fazer sobre minha geração, ressalvas necessitam ser feitas, porque entregar os pontos logo de cara é conveniente demais para ser aceito tão facilmente.
Existem algumas partes especialmente emocionantes, como as cenas de conflitos em 68, as do Chile após a eleição e após o assassinato de Salvador Allende, sem contar as entrevistas. Uma das sobreviventes japonesas da Segunda Guerra, que citei anteriormente, disse que nunca esqueceu a mãe que ninava uma criança sem cabeça logo que a bomba explodiu e devastou grande parte da população da cidade, para não falar do que não se apaga.
Apesar dos diversos elementos que destaquei, o que achei mais fantástico foi a vontade de fazer história - e de, como diz Augusto Boal, viver em sociedade, não apenas vegetar nela - quando terminei de assistir a película, que demorou 19 anos para ser produzida. Infelizmente, o que encontrei, ao deixar a sala de exibição, foi a aridez cotidiana. Entretanto, como a beleza também está nos olhos de quem vê, injeções de ânimo como essas servem para enxergamos o mundo com brilho - e nos dar força para refleti-lo na realidade -.

sábado, 8 de maio de 2010

É de lei



Ao chegar ao fim da segunda parte da empreitada para tirar a Carteira de Habilitação, as aulas de Legislação, fico imaginando o que passa pela cabeça de quem as faz obrigatórias. Lógico que é necessário ter uma noção do que se passa no Código de Trânsito, mas daí a decorar as infrações - que, normalmente, continuam a ser cometidas -?
O pior é que, se o objetivo é conscientizar, ele vai por asfalto abaixo. Como se costuma fazer após uma avaliação, esquece-se do que foi estudado, principalmente, na prática. Prova disso são as altas taxas de morte no trânsito. Será que toda essa burocracia é, de fato, a solução?
O ditado "santo de casa não faz milagre" é verdadeiríssimo no Brasil. Décadas depois dos estudos de Paulo Freire, inclusive ressaltando a importância da autonomia do aluno, ainda se insiste na imposição das determinações, sem diálogo algum. Em um local onde, ao invés de preocuparem-se em mudar a lei, os "cidadãos" preferem buscar meios de dar um jeitinho e burlá-la, é, realmente, muito mais conveniente.